sexta-feira, 3 de novembro de 2017

A importância de ler a bula

Aristóteles dizia que o homem define-se como um animal político, isto é, a sua natureza deve ser procurada nas comunidades de que faz parte e é reconhecido como membro pelos seus pares.
O termo "Cidadania", de origem latina (status civitatis), define desde finais do século XVIII o vínculo que liga os indivíduos a um Estado e se corporiza num dado estatuto jurídico-político, que lhes confere um conjunto de direitos e deveres.
O termo "Civismo" refere-se, mais especificamente, às atitudes e comportamentos dos cidadãos na defesa de certos valores e práticas assumidas como fundamentais para uma vida coletiva de modo a preservar a sua harmonia e melhorar o bem-estar de todos os seus.
"Humanismo" tem como postulação básica a exaltação da dignidade humana.
Cidadania, Civismo e Humanismo fazem, assim, parte de um mesmo processo, inerente à vida em sociedade. Seus conceitos são verdadeiros suportes da vida social. Uma sociedade onde cujos membros sejam indiferentes às questões da vida em comum não existe como tal.
A atitude cívica é inseparável da ética, isto é, de uma ação norteada por princípios que livremente o indivíduo escolheu para se relacionar com os outros. "Não faças aos outros aquilo que não queres que façam contigo" é não apenas um princípio ético universal, mas também um princípio cívico. "Não devo estacionar meu carro de tal maneira que prejudique o estacionamento de outro". "Não devo jogar lixo principalmente à beira-mar porque posso exterminar a vida marinha (peixes, tartarugas e outros)".
E uma frase específica para nós: "Não devo prescrever medicamentos só pelo nome de fantasia sem conhecer o princípio ativo com seus efeitos bons e nocivos, porque poderemos expor nossos pacientes a muitos riscos, inclusive o de adoecer e até mesmo morrer". Portanto, exortamos a todos (médico e paciente) para ler a bula, que é um ato de civismo e humanismo.


domingo, 8 de outubro de 2017

Síndrome de Burnout

To burn out, expressão de origem inglesa com o sentido de queimar por completo, foi usada pelo psicologista alemão Herbert Freudenberger em 1970 para nomear a sindrome mais badalada dos últimos tempos: a Síndrome de Burnout, também chamada "Síndrome do Esgotamento Profissional", da qual foi vítima e diagnosticada por ele mesmo. Seu símbolo internacional é um "palito de fósforo queimado".

O termo "burnout" começou a ganhar popularidade a partir de então, especialmente entre pessoas que trabalhavam em serviços humanitários, como assistentes sociais, e de saúde mental, a exemplo de médicos psiquiatras e psicólogos. Hoje em dia, seu uso tornou-se abrangente, atingindo dentistas, enfermeiros, funcionários de clínicas, hospitais, planos de saúde, professores, jornalistas, policiais. Enfim, todas as pessoas que têm algum trabalho em contato com o público que, de alguma maneira, exerce algum tipo de pressão.  

Nem a própria dona de casa escapa do Burnout devido às cobranças dos familiares. Há uma perda da energia ou entusiasmo por causa do trabalho exaustivo. Mas, o problema não é apenas o excesso de trabalho e, sim, por exemplo, uma indignação, frustração, decepção, um não reconhecimento por um esforço dispendido. 

No nosso caso específico [médicos], somos afetados por essa síndrome devido às jornadas de trabalho extenuantes e às condições precárias a que somos obrigados a enfrentar para atender com o mínimo de dignidade a população carente em hospitais públicos sucateados. São muitos os sintomas que podemos apresentar, muito similares aos do estresse, mas, fundamentalmente, somos acometidos por "um estado de perda de energia e entusiasmo". Nesta situação, nos sujeitamos a cometer erro médico com muita facilidade.  

Popularmente, quando chegamos no limite máximo da paciência e dizemos que estamos de "saco cheio" ou "não aguento mais", significa que estamos entrando em estado de Bournout . É o que nós trabalhadores brasileiros estamos sentindo. 


quinta-feira, 5 de outubro de 2017

A agonia do colesterol

“Em 1908 coelhos alimentados com gema de ovo desenvolveram Placas de Ateroma nas Artérias. Após sacrificá-los encontraram na parede de suas artérias e no fígado gotículas de gordura e concluíram que: “alimentos ricos em colesterol causam aterosclerose”. Esta conclusão armou uma grande confusão e a historia da alimentação  humana tomou um rumo errado que perdura até hoje,

            Só para lembrar, as pesquisas foram realizadas em coelhos que são vegetarianos. Porque não usaram ratos e cães que são onívoros e não desenvolvem as placas. Pegaram um animal vegetariano e deram-lhe alimento de origem animal. Seu aparelho digestivo não estava preparado para processá-lo. Seria como alimentar um leão com capim. Alimento errado para animal errado. Dessa forma estava nascendo um dos maiores equívocos da medicina”. <www.kidnoel.com/kidnoel/view.php?idc=3&sidc=685>

             Impressionou-me muito a crônica escrita pelo Dr. Dráuzio Varella colunista da Folha de São Paulo em 30/11/2013 intitulada “A agonia do Colesterol” criticando as diretrizes da American Heart Association, American College of Cardiology e Sociedade. Brasileira de Cardiologia.  Ele inicia afirmando: “Nunca me convenci de que essa obsessão para abaixar o colesterol à custa de medicamentos aumentasse a longevidade de pessoas saudáveis”. “Essa crença, que fez das estatinas o maior sucesso comercial da história da medicina - tomou conta da cardiologia a partir de dois estudos: Seven Cities e Framingham, iniciados em 1950”.

            “Considerados tendenciosos o 1º pretendeu demonstrar que os ataques cardíacos estariam ligados ao consumo de gordura animal, enquanto o 2º concluiu que eles guardariam relação direta com o colesterol”. Existem vários estudos que contestam a tese lipídica e acusam de “imprudentes” aqueles que afirmam que o colesterol é uma gordura. O colesterol não é uma gordura e sim um esterol (álcool) com estrutura semelhante a hormônio, que se torna hidrossolúvel quando ganha a capa de lipoproteína. Por esse motivo não adere à placa ou à rugosidade endotelial. São os triglicerídeos que fazem isso. O colesterol não esta nas gorduras e sim nas carnes (membrana celular) www.arzt.com..br/artigos/o-grande-conto-do-colesterol  
    
            “A partir dos anos 80, o surgimento das estatinas abafou as vozes discordantes e a classe medica foi tomada por um furor anticolesterol que contagiou a população. Hoje, todos se preocupam com os alimentos gordurosos e tratam com intimidade o “bom” (HDL) e o “mau”colesterol (LDL). As diretrizes americanas publicadas em 2001 recomendavam manter o LDL abaixo de 100 a qualquer preço sem nenhuma evidencia cientifica que justificasse tal conduta. Apenas nos EUA o numero de usuários de estatinas aumentou de 13 para 36 milhões mas a mortalidade por doença cardiovascular não caiu”.

            O Dr. Dráuzio prossegue: “Cardiologistas radicais foram mais longe, o LDL deveria ficar abaixo de 70, alvo inacessível a mortais como você e eu. Seriamos tantos candidatos que sairia mais barato acrescentar estatina ao suprimento da água domiciliar”. Recentemente as entidades maiores da cardiologia que recebem auxílios generosos da Indústria farmacêutica declararam que os níveis de colesterol não interessam mais porque o risco de sofrer ataque cardíaco ou AVC não será modificado, ou seja,esqueça tudo o que foi dito nos últimos 30 anos”.  Então porque insistir nas estatinas?  

            “Sua indicação para pacientes com alto risco cardiovascular devido a diabetes ou eventos cardíacos prévios, por enquanto resiste às criticas. E finaliza: Preste atenção, mais de 80% dos ataques cardíacos ocorre por conta do cigarro, vida sedentária, obesidade, pressão alta e diabetes. Imaginar ser possível evitá-los sentado na poltrona, ás custas de uma pílula para abaixar o colesterol, é pensamento mágico”


quinta-feira, 21 de setembro de 2017

HAFENAKRISPONRILEXDIEVICALOMEDOL e HITIVAGLISERAMATEDIARASSIM



Vocês devem estar curiosos, olhando essas palavras, tentando soletrá-las, entendê-las e se perguntando: que coisa estranha, o que é isso? Será que estamos aqui procurando a maior palavra do nosso idioma? Se estivéssemos com esse objetivo, a primeira com 31 letras e a segunda com 25 letras, perderiam para aquela que é considerada atualmente como provavelmente a maior de todas as palavras existentes na língua portuguesa: PNEUMOULTRAMICROSCOPICOSSILICOVULCANOCONIÓTICO. Deixamos para vocês contarem. Já contaram? São 46 letras.

Este imenso vocábulo refere-se a quem apresenta doença pulmonar causada pela aspiração de cinzas vulcânicas. Os dois termos que servem de titulo ao nosso artigo nem existem no nosso vocabulário, mas foram por nós criados por conter um significado assustador. Representam as iniciais de medicamentos tomados por dois pacientes.

O primeiro paciente com 70 anos de idade, do sexo feminino, casada, nos foi enviada para um Eletrencefalograma com cefaléia e tonturas, e tomava os seguintes fármacos: HALDOL, FENERGAN, AKINETON, RISPERIDON, PONDERA, RIVOTRIL, LEXOTAN, DIAZEPAN, EVISTA, CALCIO F 1000, OMEPRAZOL, DOLAMIN, ufa! São doze medicamentos. Utilizei suas iniciais e formei o primeiro nome do titulo do nosso artigo.

O segundo também do sexo feminino, com 79 anos, diabética e hipertensa, cardíaca com marca-passo, já tendo sofrido 2 AVCs, nos procurou também para realizar o mesmo exame. Estava sendo medicada com HIDANTAL, TICLID, VASOPRIL, GLIFAGE, SEROQUEL, AMARYL, ATENOLOL, DIGOXINA, ARELIX, ASSERT, IMOVANE. São onze medicamentos. Fiz o mesmo procedimento, juntei as iniciais e acima está o segundo nome.

 Temos muito que analisar, e discutir estes dois casos, mas é bom que fique bem claro: não estamos sendo antiéticos por estarmos usando o nome oficial dos fármacos, porque nossa intenção é dar maior autenticidade ao nosso artigo, não estamos condenando os remédios, pois todos têm suas indiscutíveis indicações, muito menos o fabricante, estamos sim criticando a nós mesmos Médicos Alopatas porque estamos exercitando cada vez mais a polifarmacoterapia ou Uso Irracional de Medicamentos.
 
Infelizmente não temos maiores detalhes do banco de dados dos dois pacientes, particularmente os referentes à posologia. Contudo podemos fazer algumas suposições e seria bom fazê-las, pois serviria para despertar, chamar a atenção do jovem colega iniciante na profissão bem como para uma reciclagem de nós mesmos os mais experientes, apenas sobre a dose diária deixando de lado a dosagem unitária de cada fármaco ou outras questões atinentes, até porque não teríamos espaço suficiente.

Vamos supor que nosso primeiro paciente tomasse 2 comprimidos diários de cada medicamento, seriam 24 comprimidos por dia ou seja 1cp a cada hora ou 2 cps a cada 2 horas, três a cada três horas e assim por diante até chegarmos a oito cada oito horas ou doze a cada doze horas. Neste último caso o nosso enfermo encheria sua “mãozinha” e tomaria os comprimidos com bastante calma e cuidado, um de cada vez, para não engasgar-se. Caso isso acontecesse, poderia ser muito grave e até mesmo letal na sua idade especialmente se morasse sozinho.

Por mais que busquemos explicações, indicações, sintomas, queixas, “doenças” não encontraríamos justificativas para tamanha polifarmácia. E as interações medicamentosas? Se por pura curiosidade tentarmos ler suas bulas, vamos nos espantar.
Para evitar ocorrências como essas, deveríamos abrir um espaço na nossa consulta para anotar o nome dos medicamentos do nosso cliente e ter a humildade de reconhecer nossos limites e ignorância (não somos donos da verdade e do saber) e consultar o Dicionário de Especialidades Farmacêuticas (DEF) às nossas mãos em livro, ou no computador, em frente do nosso paciente sem 
sentir vergonha (eles adoram quando o medico faz isso). Um dos maiores filósofos da humanidade Sócrates conhecedor de que o limite de sua sabedoria era sua ignorância, dizia com muita propriedade e reconhecida humildade: “Só sei que nada sei”.  Por que não dizer o mesmo?

 Se fôssemos nós os pacientes (e não é difícil, pois somos humanos e também adoecemos e morremos) será que teríamos a coragem de encher nossas mãos com 12 pílulas para depois engoli-las?
Quanto ao segundo paciente que temos mais informações (é só ler logo acima seus problemas) e por isso aparentemente mais doente (não diríamos que tem mais doenças porque não existem doenças e sim doentes) que o primeiro, colocaria em dúvida apenas a indicação do Hidantal a não ser que tenha uma epilepsia lesional provocada pelos AVCs e o uso do Seroquel que é o fumarato de quetiapina indicado principalmente na esquizofrenia e secundariamente no transtorno afetivo bipolar.

Essa medicação deve ser usada com cuidado em pacientes cardíacos com doenças. cerebrovasculares, com tendência a convulsão (termo leigo, conhecido cientificamente como crise epiléptica generalizada) e também ter cuidado no seu uso concomitante com hidantoina (Hidantal). Todas essas restrições o nosso paciente apresenta e além do mais ele é idoso com 79 anos. Insisto: VAMOS LER A BULA, VAMOS CONSULTAR A INTERNET. Isso é o mínimo que podemos e devemos fazer, o correto mesmo é estudar ou revisar Farmacologia Clinica  e Terapêutica e entender o que é farmacodinâmica, farmacocinética e Interação Medicamentosa.

Pensemos nisso, reflitamos, meditemos, sintamos na nossa pele, no nosso corpo, na nossa alma. Acreditamos que a mais inteligente, mais humana, mais sábia citação da humanidade é: “Não façamos aos outros,  o que não gostaríamos que fizessem com nós mesmos”.

sexta-feira, 15 de setembro de 2017

Medicalização e Medicamentalização



             Medicalização é o processo em que questões da vida social, sempre complexas, multifatoriais e marcadas pela cultura e pelo tempo histórico, são reduzidas à lógica médica, vinculando aquilo que não está adequado às normas sociais a uma suposta causalidade orgânica, expressa no adoecimento do individuo. Assim questões como os comportamentos não aceitos socialmente, as performances escolares que não atingem as metas das instituições, as conquistas desenvolvimentais que não ocorrem no período estipulado são retiradas de seus contextos, isolados dos determinantes sociais, políticos, históricos e relacionais, passando a ser compreendidos apenas como uma doença que deve ser tratada. ” <http://medicalizacao.org.br/>

 
            De maneira simplória, Medicalização é encarar aquilo que pode ser corriqueiro na vida de um indivíduo até mesmo intrínseco à sua própria personalidade, à sua maneira de ser como um problema de saúde e, consequentemente, como assunto de domínio medico porque acredita-se que está fora das “convenções sociais”. Não existem mais “pessoas diferentes” existem “distúrbios de personalidade”. Vamos citar alguns exemplos: se uma pessoa está triste, é depressão inicia-se imediatamente o uso de antidepressivo; se está alegre demais, está maníaca, precisa de antipsicóticos; se muda de um estado de melancolia para euforia ou vice-versa, é bipolar tem que começar a tomar um estabilizador de humor; se é idoso e está esquecendo, é  Mal de Alzheimer; se a glicemia em uma única amostra resultou alta é taxado de Diabético; se o colesterol está elevado, não se questiona, é logo medicado; se a pressão arterial em uma única aferição mostrou-se acima da media é medicado incontinenti com hipotensor; se a criança é hiperativa o diagnóstico é sem duvida TDAH e lhe é prescrito  Metilfenidato; se tem o hábito de lavar as mãos mais vezes do que o “normal” está sofrendo de TOC  e assim por diante.  

            A Medicamentalização é, portanto uma decorrência da medicalização. É um neologismo que busca traduzir a intensidade da penetração dos medicamentos em todos os segmentos e dimensões da vida social. <http://cienciahoje.uol.com.br /colunas /sentidos-do-mundo/uma-ao-acordar-outra-ao-deitar..> Vivemos atualmente em uma cultura do mal-estar subjetivo cuja contra-partida foi o surgimento de uma medicina do bem-estar. A medicamentalização do mal-estar é uma realidade efetiva, atual e crescente. <Words and pills: on today’s malaise medication – Scielo>. Em resumo se toma medicamento para qualquer coisa hoje em dia. Medicamento só não está sendo utilizado para tratar falta de dinheiro. AINDA NÃO!